![]() CARTA AO MENINO LUIGHIQuerido jogador de futebol do Palmeiras Luighi.
Ninguém aguenta mais este mundo, não é mesmo?
Escrevo aqui após ver, durante todo o dia, o absurdo ocorrido a seu respeito. Por solidariedade e identificação.
O que mais surpreende é que os que lhe insultaram são, a rigor, de etnia sul americana típica.
Parda! Vai entender!
Mas o contraditório ser humano - o pretenso ápice das raças planetárias! -, ainda não se habituou a lidar com o óbvio ululante, sobre o qual múltiplas espécies de animais ditos irracionais dão modelo de conduta exemplar: o respeito à vida! Em toda a sua exuberante diversidade!
O respeito, portanto, e por conseguinte, à vida humana!
Mas isso parece surpreendentemente, em pleno século XXI, sofisticado demais para o intelecto e a sensibilidade desses estranhos seres terrestres!
E segue a vida humana desprezando e oprimindo a própria vida humana manifesta na magnífica riqueza da sua diversidade!
Caro Luighi: sei que não sabe quem sou. No entanto, não resisto a vibrar para você a minha solidariedade. Por compreensão. Por identificação. Por ter de algum modo, desde a infância, sofrido na pele, em episódios pontuais, o que você sofreu.
Pois se, por algum capricho do destino, a minha história de família decorresse nos Estados Unidos, onde a árvore genealógica define a etnia, minha bisavô africana me definiria inapelavelmente como de raça negra. Não branca, como consta aqui na minha carteira de identidade. E por mais que a minha filiação aconteça de mãe de descendência holandesa e, em parte, de meu pai, de portugueses e italianos.
No Brasil, com frequência, todavia, se normaliza a prática racista; e o assédio moral, e todas as deprimentes repercussões psicológicas e emocionais, são convenientemente atribuídos a fricotes; a melindres de gente fraca, de compleição psíquica que peca por excessos de sensibilidade.
Até parece!
Passei parte da vida, na infância e na adolescência, pagando um preço emocional alto por possuir "cabelo de bombril". Por não poder competir com a ditadura do padrão estético feminino das adolescentes, entre meninos idiotas que, na época, só valorizavam pele menos tostada, cabelos de manteiga ou olhos azuis.
E até mesmo - durma-se com um barulho desse! - por, pertencendo a um perfil étnico, diga-se, "encardido" que, na miscigenação, produz a tez de pele morena, nem branca nem preta, ser atacada por crianças pretas que me odiavam por me julgarem branca. E ainda por, ao longo da vida, me sentir perplexa, ao presenciar homens pretos, por outro lado, renegando a própria raça, ao voltar as costas para todo tipo de mulher que não possuísse cabelos platinados e pele branca, de preferência, ao modelo alemão!
Por isso tudo, menino Luighi, me sensibilizo. Solidarizo contigo através da escrita, o meu melhor meio de expressão.
Porque o que sinto é que você poderia ser um filho. E, com a devida vênia - fosse você meu filho, e eu presenciasse a injusta humilhação pela qual você passou - não hesitaria em enxugar as lágrimas assim que me recompusesse.
Marcharia em seguida, resoluta, para lançar mão de todos os meios judiciais que estivessem ao meu alcance para lhe ajudar a justiçar a honra!
Então veríamos quem, no frigir dos ovos, não haveria de pular feito macaco para encarar as consequências graves da sua grave ignorância!
Da sua falta de luz espiritual!
Ah, mas isso, infelizmente... temo que esse desfecho, num mundo povoado por esta humanidade ainda imperfeita, não passe, por enquanto, de utopia!
Ideal seria a sonhada fraternidade de anjos e de homens!
Em todo caso, e enquanto não acontece, acolha a solidariedade maciça da qual, apesar de tudo, e neste momento, você está sendo alvo!
Está sim! Acredite!
Porque ainda existe muita gente boa!
Gente de fato humana!
Existe sim!
Imagem: Internet Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 07/03/2025
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