Zênith

"Estar no mundo sem ser do mundo"

Textos

MOMENTOS PERDIDOS NO TEMPO

💜🌸💜

Esses dias meu saudosismo, que de tempos em tempos aflora, me levou a visitar a antiga, e na época excelente escolinha municipal onde cursei o que nos anos setenta se chamava primário (prefiro não citar o nome da escola, respeitando a não exposição).

 

Emocionada, pude passear pelo pátio dianteiro da instituição, onde sonhei, recordando o hasteamento da bandeira, as formas no pátio interno, as brincadeiras ruidosas num barranco circundante do muro, que hoje não existe mais.

 

Vi a quadra nova e a árvore centenária, em frente à qual eu e a melhor amiguinha 'conversávamos com os marimbondos', em todos os dias no horário do recreio, e em meio ao alarido feliz das crianças brincando e correndo pelo pátio.

 

E, um pensamento curioso - não tínhamos medo dos marimbondos. Conversávamos com eles, eles zumbiam e era tudo.

Nunca nos atacaram! 🥰

 

Porém, retomando... não pude entrar, como desejava, na escolinha para uma visita, como pretendia, e como aconteceu décadas atrás, ao me formar em Literatura e Português e escolher estagiar, então, justo na turma da também saudosa professora Giselia do meu quarto ano primário...

 

Pois a escolinha está diferente, como diferentes são os nossos tempos.

 

Compreensível. Questões de segurança - alegou uma coordenadora que se dignou falar comigo do pátio interno, hoje isolado do pátio de fora por um imenso portão gradeado e fechado a chave.

 

Ao redor da escolinha, e separando a quadra, também há grades de isolamento - eu já havia reparado, desde a entrada.

 

Embora entristecida, compreendi. Conversei com a coordenadora e falei um pouco de mim. Contei da memória afetiva enorme que sempre me arrasta às lembranças doces daquela escola; relatei um pouco sobre a minha vida, tendo nascido naquele bairro, e sobre minha Licenciatura e estágio com a professora querida da infância...

 

Mas ninguém traz na testa um selo de autenticidade para o que se diz, e, embora eu considere não ter jeito nem cara de meliante ou de atravessadora de entorpecentes, é justo que, e em especial nas escolas públicas de hoje, haja cuidado triplicado com a segurança - prevenindo, assim, situações óbvias: saídas de alunos sorrateiramente, introdução do tráfico, assaltos, furtos, e, mais recentemente, para o nosso estupor, serial killers!... Algo inimaginável por aqui há apenas alguns anos atrás, mas que vem ganhando terreno no país, na medida do alastramento de uma condição de adoecimento psicológico e espiritual da humanidade planeta afora...

 

Assim, exercendo a civilidade que se pedia para o momento, agradeci ao menos a conversa. E me dei por feliz com a possibilidade de abraçar carinhosamente, reconhecida, a querida árvore...

 

Ela está lá, centenária, frondosa e linda, contemplando serenamente as múltiplas modificações das décadas sucessivas...

 

Alunos às centenas, que vêm e vão, assim como professores, funcionários... pássaros e insetos acolhidos nos seus ramos generosos... Os silêncios e ruídos diurnos e noturnos, os risos dos passantes nas calçadas, as vozes e dramas dos moradores da vizinhança...

 

Os assuntos e segredos dos estudantes...

 

Chuvas e sol...

 

E os alunos pequenos que, porventura, ainda lhe concedam uma prosa angelical, nos intervalos entre aulas para o lanche... se é que ainda lhes cabe a liberdade de voo até aquele recanto bucólico do pátio, no recreio...

 

Liberdade!...

 

Não é só e apenas um conceito nos dias em que vivemos, cercados por todos os lados por grades e proteção... contra o outro! O que, segundo reza o mito, deveria ser o nosso 'próximo'...

 

'Pássaros feridos!'...

 

Tudo passa sobre a Terra, e ainda assim, a Vida, vitoriosa, continua!...

 

E temos muitas vidas - ainda aqui!

 

Onde estão aquelas meninas que conversavam, inocentes e felizes, com os marimbondos? Sem medo, sem conjecturas - somente imersas, confiantes, na luz de um agora sempre puro, sempre novo, sempre jovem?!

 

Uma delas está aqui e agora, e permanece na atitude de se manter desperta naquela Luz que fica, sempre, consciente!...

 

Hoje, converso com as borboletas que encontro pelo caminho, com as minhas plantas, gatos e flores... 🌳🌸🌻🌸🌳

 

A vida é eterna, em nós, em tudo, em meio às ilusões da incessante transitoriedade.

 

Todo o meu amor e gratidão à querida árvore centenária, que então me recebeu sem grades, não me temeu... Que recebeu o meu abraço, e, certamente, me reconheceu!...

🌳

Foto:

Sumaúma - Jardim Botânico RJ

Christina Nunes

Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 28/04/2023
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