"OH, CAPTAIN, MY CAPTAIN!..." Tributo a Robin Willians Quando o filme Sociedade dos Poetas Mortos foi exibido nos cinemas, eu acabara há pouco a minha faculdade de Letras, e hoje sei que o personagem interpretado com brilhantismo por Robin Willians, John Keating, foi o catalizador que, em conjunto com outras circunstâncias de foro íntimo, me presenteou com a sensação de redenção por ter me formado por puro amor em algo que, no nosso país de contrastes educacionais e culturais desfavoráveis, não serve a quase ninguém para alguma finalidade prática que não seja lecionar línguas estrangeiras ou português em salas de aulas repletas de alunos das mais disparatadas compleições sociais, que com muita frequência não exatamente vão considerar o estudo da literatura ou da gramática como algo tão eletrizante quanto o último lançamento block buster dos cinemas. Para os que não viram o filme, a história nos conta sobre o professor de literatura John Keating, que, num colégio tradicional e rigoroso para garotos nos Estados Unidos, era o mais absoluto contraste frente à austeridade de outros colegas de profissão enquadrados no sistema - como um filme em preto e branco diante de um colorido, ou como alguém que baila e dança e sorri, entre soldados de chumbo marchando em exército mecânico. No decorrer do filme, John ensina seu grupo de alunos a respeito de poesia, sem se deter em livros ou somente em regras de métrica e rima; mas mostrando àquele grupo de adolescentes, já portadores de apatia preocupante sob a pressão de suas famílias gessificadas nos costumes de época e das etiquetas sociais, que poesia é vida, a ser saboreada, criada e vivida! E conta-lhes sobre seus próprios tempos de estudante, naquele mesmo Colégio seleto para alunos internos, quando participou do grupo quase místico batizado Sociedade dos Poetas Mortos. E explica, sob os olhares fascinados dos rapazes, sobre o que faziam, altas horas da madrugada: burlando a vigilância rígida dos inspetores, escapuliam por entre as neblinas geladas das planícies no inverno para o encontro quase ritualístico na gruta, onde liam, fumavam, riam, gargalhavam, dançavam, e criavam poemas em regime de improviso. E se reuniam sob os auspícios de um lema, proposto por Keating - Carpe diem! - Aproveite o dia! - e dos versos de Henry Thoureau, poeta e escritor americano, que rezam: "Fui para os Bosques viver de livre vontade. Para sugar todo o Tutano da Vida. Para aniquilar tudo o que não era vida e para quando morrer, não Descobrir que não vivi..." Um dos meninos mais brilhantes de sua turma, embora também o mais tolhido pela severidade do pai, que quer vê-lo formado em medicina em contrapartida aos seus anseios e talento para o teatro - Neil - é o que mais se entusiasma com a ideia de ressuscitar a antiga Sociedade, e, instigando seus colegas, consegue realizar este intento. Feliz, Neil se inscreve como ator no programa cultural do Colégio, para a peça de Shakespeare, Sonhos de Uma Noite de Verão, interpretando Puck. Enquanto isso, é inspirado pelas reuniões cada vez mais férteis em criatividade com os amigos, que também e aos poucos vão tomando gosto pela novidade e pelos efeitos benéficos que a aventura vai proporcionando ao próprio aprendizado da disciplina de Keating, antes considerada aborrecida, como todas as outras, ministradas pelos docentes pelos métodos tradicionais pouco eficientes, e desprovidos de maior sentido para suas vidas. Mas aquele idílio só dura até o ponto em que, em paralelo, o sucesso de Keating com seus métodos de ensino pouco ortodoxos começa a despertar a animosidade dos demais profissionais e da direção do colégio; e, ao mesmo tempo, o pai de Neil descobre o ardil com que o filho dribla sua vigilância para atuar na peça. Ele tenta obriga-lo a desfazer-se do projeto, embora depois, estranhamente, o consinta. Mas apenas para ao fim de tudo comunicar o filho de que o retirará do Colégio, para atende-lo nos objetivos rígidos que quer para a sua carreira futura, e determinando, sem apelação, que nunca mais se envolverá com teatro. No final trágico, o rapaz comete suicídio, em cena tocante. Deixa, no frio nevado da janela de seu quarto, a coroa florida do seu personagem do teatro, após a noite de apresentação bem sucedida na qual foi ovacionado por toda a platéia de pais, professores e alunos. Arrebata a arma do pai, enquanto este e a esposa dormiam, e corta o fio precioso da vida com um tiro na cabeça - como se atendendo ao apelo dos versos de Thoureau, recusa-se a deixar de viver, para se dobrar a uma exigência imposta ao seu destino que, de qualquer modo, o condenaria ao fardo de não viver como compreendia a vida. Foi deste modo que o personagem legendário de Robin Willians marcou a universitária recém formada justamente em Letras, sem pretender exatamente seguir o magistério, mas, e embora sem saber bem o que faria disso depois, apenas por saber e amar desde sempre ler, escrever, e aprender idiomas. As décadas se passaram, e carreguei aquele John Keating dentro de mim, como inesquecível homenagem aos meus mais belos ideais num país no qual, infelizmente, o escritor se vê fadado a se orgulhar não mais do que por ser escritor, na maioria das vezes - já que o sistema só agracia profissionalmente aquele escritor que, a par de sê-lo, ainda conta com a rara estrela que o favorece e converte em máquina editorial de fazer dinheiro. Mas - oh, captain, my captain! - rezava a saudação tradicional dos novos poetas mortos diante de John Keating - você houve por bem agir como o Puck! Deixou sobre a janela nevada de nossos invernos sua coroa de louros cheia de frutos maduros, através dos filmes com os quais nos encantou os corações - e rompeu com o fio de sua vida! Para conseguir viver? Para "viver de livre vontade... Para sugar todo o Tutano da Vida. Para aniquilar tudo o que não era vida e, para quando morrer, não Descobrir que não viveu?..." Os dilemas, os sofrimentos, as amarguras e ansiedades de Robin Willians, esta lenda da cinematografia de nossos tempos, foram os de muitos de nós. E, n'algum momento, parecem tê-lo vencido. Robin decidiu procurar suas respostas e a realização de seus melhores anseios naquela outra realidade, que um dia aguardará a todos como a única certeza absoluta desta nossa passagem curta pela materialidade. Como espírita, desaconselho com veemência a retirada do fio da vida antes que o próprio Criador nos convide a deixar este mundo. Há uma programação séria, bem elaborada antes de cada retorno à matéria cujo curso, se interrompido drasticamente, lança o espírito em inevitável quanto intenso estado de perturbação e sofrimento. Todavia, não compartilho da ideia inflexível de que todo suicida, fatalmente, fique preso nas malhas do umbral sombrio, sendo punido e acusado por almas infelizes como covarde ou alucinado. Creio firmemente que há infinitas nuances nesta questão delicada, que pedem respeito, compaixão, entendimento, e, sobretudo silêncio de quem fica, porque do momento do reencontro de cada um de nós com o Criador, no retorno para cada uma de suas infinitas estadias, sabemos somente nós, Ele mesmo, e os tutores dimensionais que, amorosos, nunca desamparam ninguém que lhes mereça a intercessão para a cura e o acerto do rumo. Robin Willians, excelente ator, deixa-nos o presente de incontáveis filmes de conteúdo significativo, luminoso, bem humorado. Ser humano como todos somos, estava doente, e enfrentava desafios difíceis. Não o julguemos, portanto, por suas hesitações compreensíveis, e por enganos que fazem parte das trajetórias de todos que seguem seu aprendizado sobre a face da Terra. Muito obrigada, John Keating/Robin Willians - por ter me incentivado, ainda tão jovem, a aprender a olhar cada capítulo da vida, seja lá qual for, de sob o ângulo diferente alcançado do alto de uma mesa!... Oh, captain, my captain! Que as falanges de luz do invisivel o acolham, o cuidem, o encaminhem a estradas mais felizes, mais floridas - ao encontro da saúde, do amor e da paz, e das respostas que talvez não tenha conseguido encontrar em meio às turbulências muitas vezes desnorteadoras deste mundo! Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 15/08/2014
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