Zênith

"Estar no mundo sem ser do mundo"

Textos


O DIA EM QUE DEIXEI DE USAR RELÓGIO

Ofereci a uma amiga querida o best seller O Poder do Agora, de Eckhart Tolle, e como o conteúdo me parecesse sumamente interessante comprei para mim também, apenas para confirmar essa primeira impressão.

A bem da verdade, não se trata de nada que o Mestre Osho, por exemplo, já não tivesse abordado com maestria: a volta para casa; o reencontro com o Ser, com a Presença em nós e em tudo, unificando a todos. De forma que em variados momentos da leitura acorre-me a sensação de me estar deparando com um de seus discursos iluminados. Todavia, inegavelmente, trata-se Eckhart Tolle de mais um canal da Verdade; daquela Verdade única que se manifesta em variados momentos através de um instrumento humano digno e, lendo-o, compreendemos a razão pela qual atualmente é considerado um iluminado no sentido mais castiço do termo.

Inclusive, e como novos insights sempre afloram na medida em que tomamos contato renovado com a linfa purificada dessas manifestações do Ser, foi durante a leitura do Poder do Agora que se reavivaram uma vez mais ao meu entendimento as razões do fenômeno curioso acontecido na área dos meus hábitos cotidianos, depois de ter alçado o magnífico vôo liberto por intermédio do recebimento do sannyas de Osho, tantos anos atrás.

Antigamente tinha a mania compulsiva de colecionar relógios... cujo ranço perdurou até algum tempo atrás, como uma sombra que se esvai, tênue. Em parte pelo hábito de meu pai de viver me presenteando com modelos de relógios novos. Com o passar dos anos adquiri o vício de não apenas usar relógios de pulso, mas de comprá-los compulsivamente, até o ponto indesejável de adquiri-los, simplesmente para nada... apenas porque os modelos me agradavam aos olhos, eram originais, insólitos, exóticos, ou de uma cor da minha preferência. Assim, me empolgava, comprava, usava uma ou duas vezes e quando lá se ia a bateria de mais um desses objetos descartáveis eu os encostava na gaveta até atingir o disparate de comprá-los e, simplesmente,... não usá-los!

Bem... com o decorrer do tempo as maravilhas da jornada espiritual começaram a eclodir na caminhada cotidiana. Deparei com as revelações facilmente comprováveis acerca das armadilhas do tempo como empecilho do mergulho no presente que, obviamente, é a única coisa que possuímos de vivo, de real - e em qualquer época! Eckhart, assim como Osho, nos alerta com maestria sobre as ilusões do passado e do futuro como realidades em si. Passado e futuro, de fato, nunca aconteceram nem acontecerão num espaço que não seja o eterno e sagrado agora! Não mesmo! Este Agora, caros, é a única realidade maior!

Neste Agora está a nossa presença; a Presença Suprema! A única, aliás, que existe. Confinados neste agora é que realizamos as mudanças necessárias de modo a compreendermos que não existem os problemas, assim como os concebemos - com identificação! Pois a realidade é que não somos esses problemas!

O ponto, todavia, é que a nossa mente assimilou toda essa gama de problemas situados no tempo cronológico criando para nós um falso eu. Nesse contexto, Eckhart diz, de maneira única, magnífica: todo o segredo é sabermos morrer ainda em vida, no sentido de abandonarmos tudo aquilo que não somos a fim de encontrarmos o nosso Ser real: títulos, nome, objetos, apegos... tudo o que pensam de bom ou de ruim a nosso respeito...

Pois é o que nos acontecerá na hora da morte corporal! Abandonaremos, irrevogavelmente, tudo aquilo que não somos! Retornaremos da vida corpórea tal qual viemos a ela: nus! In natura! Já pararam para pensar a respeito de si mesmos desta ótica?!

Pois se não, seria interessante a reflexão inicial a respeito, já que apenas assim entenderão em plenitude as ilusões do tempo: do se viver presos entre as referências fantasmagóricas do passado e as projeções de um futuro que ainda não se realizou. É o que a maioria de nós faz automaticamente o tempo todo. A conversa mental não finda! É facilmente observável. Analisem se num ônibus ou no carro, durante a trajetória para o trabalho profissional diário, por exemplo, vocês não mergulham inconscientemente num falatório mental a respeito dos acontecimentos de ontem - o que houve, como deveriam ter reagido ou como reagiram, o que pensam os outros a respeito de vocês ou disso ou daquilo - ou de suas expectativas para os próximos dias ou horas...

Reparem se permanecem durante a viagem presentes! Simplesmente presentes. Imersos na contemplação deleitosa do céu azul, das eventuais árvores floridas, de alguma bela criança sorridente... plenos em vocês mesmos! Mesmo que para isso seja preciso ignorar o engarrafamento, o tumulto habitual do caos urbano, as preocupações com os horários...

Asseguro que na maioria das vezes não. Pois não é fácil libertar-se, num primeiro momento, da tagarelice habitual da mente acerca de passado e futuro. É este, assim, o maior fator gerador de stress, de ansiedade. Ansiedade pelo que aconteceu; ansiedade pelo que ainda está por vir! Só que nada disso somos nós! Mas a mente tenta nos identificar com isso, pois só sobrevive assim, e é a forma que encontra para nos dominar... e é assim que nos mantemos distanciados do Ser real: da fonte de equilíbrio e tranqüilidade presente eternamente em nós e em todos, à espera de que despertemos para a sua existência - a nossa identidade real!

Não existe libertação maior que essa: a compreensão de que não somos os nossos problemas! De que o que somos de fato nada tem a ver com eles e está aqui e agora, acessível, presente, pois não poderia deixar de estar... É o âmbito da Eternidade em nós! E é esta, justamente, a nossa real identidade; a nossa libertação!

Pois foi com essa grande, maior e definitiva sacada que, num ato reflexo espontâneo, natural no meu cotidiano, eu simplesmente não agüentei mais usar relógios! Subitamente me dei conta: de lá pra cá não compro, não uso! Misteriosamente... mal olho os relógios! Foi como um salto definitivo para fora das armadilhas do tempo... até mesmo nesse detalhe peculiar!

E... coisa incrível! Não perdi de forma alguma a referência nem o ponto de contato com a administração de minhas atividades diárias. Basta uma ou duas únicas olhadas para o relógio de parede ou do aparelho celular em casa pela manhã. Acordo, faço o que tenho que fazer. Saio com minha filha sem me preocupar com a hora. Sigo para o trabalho. Chego e, ocasionalmente, olho o relógio de parede: estou lá exatamente quando deveria estar!

O tempo maior, soberano, absoluto... o único existente, com toda a mecânica universal necessária a nós em cada ponto da jornada... reside, sempre residiu em nós! E é libertador descobrir que precisamos somente usar em nosso proveito os instrumentos de referência cronológica deste mundo, sem nos escravizarmos a eles - mantendo-nos acordados no eterno presente! Despertos na única realidade! No poder libertador do Agora!

Eis aí, queridos, a história do dia em que deixei de usar relógios!

Grande abraço!

Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 31/08/2008
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