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"Estar no mundo sem ser do mundo"

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POR QUE SOMENTE EM GRAMADO?!...
As pessoas, muitas vezes, estabelecem comparações - e incluo-me nelas - entre a qualidade de vida e o padrão precário de educação vigente em cidades grandes como o Rio de Janeiro e São Paulo e aquilo que se observa em países distantes da Europa, ou noutras partes do mundo alcançáveis, por muitos, apenas através dos sonhos ou dos documentários de tv.

Não haveria esta necessidade. Bem próximos de nós, dentro do nosso país mesmo, há contrastes inexplicáveis.

Faz uns dias, uma das minhas tias voltou, em estado de graça, de uma excursão a Gramado, no Sul.

Não conheço nada do Sul. Todas as minhas viagens turísticas dentro do Brasil, dada a minha índole solar e afeita aos panoramas paradisíacos dos trópicos, se realizaram da Bahia para cima. O renitente problema alérgico e respiratório, predominante não apenas na minha saúde mas também na dos meus filhos, desanimou-me, até o momento presente, de aventurar-me em passeios por aquelas bandas; não obstante, reconheço que perco um magnífico espetáculo; ninguém mais que eu vibrou tanto com o visual mágico exibido há poucos anos no esplêndido seriado "A Casa das Sete Mulheres", todo passado no sul do país, nos horizontes mágicos do Rio Grande - um regalo em matéria de literatura e de visual para os nossos olhos cansados das empoeiradas paisagens urbanas.

Só havia conhecido Gramado, talvez, em documentários. Reunimo-nos em família para ver as fotos e o filme que meus tios e primo exibiram, entusiasmados e ainda dominados pelos efeitos subidamente benéficos da viagem.

Não há o que se dizer das fotos, senão que se me afiguraram coisa de sonho; Gramado tem o dom de converter o panorama gélido do inverno num horizonte mágico. As fotos - muitas delas, mas principalmente as batidas diante do conhecido Rio Negro - mais lembravam pinturas, tamanha a perfeição natural de imagem e de equilíbrio entre sombras e luz. Mas, o que de fato deixou-me estarrecida foi o que vi no filme.

Amigos, existe, sim, no Brasil, um lugar pelo menos, onde as casas não têm portão nem grades!!; onde (!!!) motoristas param sem necessidade de sinal, tão logo o pedestre ameace por o pé para fora do meio-fio na intenção de atravessar uma rua; onde, como não bastasse a soberana beleza natural da cidade, ainda soma-se a limpeza inatacável, a ausência da miséria, a educação refinada do povo...

Mas...onde?! - alguém pode se espantar - onde, no país se acha isso?! Não nos esqueçamos das dimensões continentais do Brasil que não se resume ao triângulo Rio-Minas-São Paulo; sobretudo tenhamos em vista - e vi a prova cabal - que os maiores centros populacionais não têm, necessariamente, que significar o modelo de avanço cultural e educacional de uma nação - e afirma-lhes isso uma carioca!

Desconheço se no país existem outros lugares que apresentem tamanha evidência de civilidade e sucesso na administração de uma cidade. O que sei, meus queridos, é que, após esta viagem em estado de estupefação pela filmagem exibida no fim de semana pelos meus parentes, o que mais me chamou a atenção durante a semana, acentuando-se a sensação de mal estar sobre esta questão, foi a constatação repentina de que estão se tornando febre, no Rio de Janeiro, as cercas eletrificadas.

Pasmem! A que ponto chegamos em matéria de medo e insegurança! Durante estes dias, no trajeto para o trabalho, perdi a conta dos prédios, residências, casas, e outros, cujos donos, na impossibilidade de defesa contra o crime e a violência que grassam por aqui, mais livres e impunes do que passarinhos, apelam mais e mais para esta que bem pode ser considerada uma medida de desespero, qual a de cercar muros e edifícios com cercas eletrificadas. Enquanto em lugares como Gramado nem portões existem, em muitas moradias.

A pergunta avulta, inevitável: por que somente em Gramado?

Articulamos a mesma língua, pertencemos a um mesmo país. Por que índole e educação só puderam ser moldadas segundo estes padrões mais avançados numa fatia do Brasil, quando, por direito, todos deveriam ter em si incutidas estas altas noções de bem viver, desfrutando de um privilegiado nível de qualidade de vida?

Regionalismos? Questões da índole e da mentalidade pertinentes apenas a um reduzido grupo populacional dentro de uma mesma nação? Pouco provável... Trata-se, antes, de um problema complexo, envolvendo, antes de tudo, questões administrativas dos governos, diretrizes educacionais e culturais...

Mas não passa pelo universo e objetivos deste Portal uma incursão mais profunda nestas sérias questões. Cabe aqui, apenas, ensejo à reflexão e um apelo à compreensão no sentido de se fazer ver claramente que, se quisermos realmente - cada um de nós - podemos dedicar empenho no auto-burilamento, condicionando-nos a um padrão mais elevado de mentalidade e de conduta para com o nosso lugar de origem e para com o nosso próximo.

Empenhemo-nos, isso sim, em contribuir, de boa vontade, na manutenção da limpeza da nossa cidade e bairros; não atiremos levianamente lixo ao chão, ao asfalto quando dentro de coletivos, agindo compelidos pela cega ignorância de que nada disso tem importância porque amanhã o gari estará por ali limpando. Não é este o ponto; a poluição visual de um lugar é de nossa responsabilidade direta; as enchentes que assustam Rio e São Paulo em decorrência dos esgotos entupidos pelo lixo, que não dão vasão ao fluxo torrencial das chuvas, também.

Não arremessemos nossos veículos sobre o pedestre que atravessa! É uma ameaça direta à vida humana que vem ostentando, lamentavelmente, a cada dia, menos valor aos nossos olhos. E no dia seguinte será você o pedestre irritado com o motorista leviano que lhe ameaça a vida tão inescrupulosamente. Respeitemos, nas ruas, sinais, faixas de pedestres, sempre, na medida do possível; se todos se empenham nestas coisas aparentemente pequenas, já será significativa a contribuição... Porque se estes princípios comezinhos de civilidade não passarem, efetivamente, a constituir a substância da consciência do povo das grandes cidades brasileiras, infelizmente, por muito tempo ainda teremos que conviver com esta dúvida desoladora que assenhora a todos os que se aventuram pelos oásis esparsos das realidades mais felizes dentro do nosso próprio país:

"Por que somente em Gramado?"

Com amor,
Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 11/02/2006
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