Zênith

"Estar no mundo sem ser do mundo"

Textos

VISÃO DE CIMA
Noutro dia alguém fez um comentário interessante. Disse que adora a natureza - mas de longe! Desde que percebeu que natureza, quando de muito perto, significa convivência com besouros, abelhas, formigas e sujeiras da terra. Achei gozado. Fiz certas associações.

Fiquei imaginando que deve ser bem esta a ilusão que vivenciamos na fase imediatamente anterior a cada reencarnação. Fazemos nosso "plano de vôo", sob a orientação dos nossos guias: família tal, país tal, amigos tais, outros nem tanto que "devem vir a ser amigos", preferências tais - ideais de harmonização maravilhosos, visando a auto melhoria conjunta, evolutiva. Nas reencarnações sob estas circunstâncias (diferentes das compulsórias, cujo grau de obscurecimento espiritual requer as diretrizes dos rumos da reencarnação, integralmente, nas mãos dos Senhores do Carma e dos Mentores maiores, em razão do despreparo do ser para dispor de escolha nestes pormenores) devemos partir rumo a mais uma experiência carnal cheios dos melhores propósitos e de entusiasmo!

Afinal - foi-nos dito e relembrado - cada estágio material, diante da extensão da eternidade, dura menos que um piscar de olhos! Não estaremos desamparados, e, em última análise, existem, de permeio, muitos prazeres também: voltaremos junto com um grupo numeroso de afins comuns: amigos, seres amados; simpatias espontâneas que pipocarão aqui e ali, para amenizar a impressão produzida pela rispidez, por vezes aguda, dos acontecimentos. Paisagens belas na Terra; lazeres; crescimento na convivência mútua, mais aprendizado - no mínimo, estacionaremos aonde estamos, não andaremos pra trás. E a tendência é sempre a melhoria!

Lá das outras paragens, afinal, a Terra deve mesmo aparecer linda, tal como na visão dos astronautas! Azul, redondinha, límpida - pelo menos de longe! É a impressão causada pelas belas paisagens das montanhas, praias, cachoeiras e campos a todos os amantes da natureza, reencarnados por aqui. É a chamada "visão de cima", desprovida de ângulos agudos, de aspereza, de obstáculos e de detalhes desanimadores. Voltamos, desta forma, sob a impressão provocada por esta "visão de cima": o que temer, se contamos com tanta ajuda? O que temer num panorama assim, divino - o corpo planetário de um azul intenso e límpido, como um atestado maior do supremo equilíbrio, indefectível, com o qual a divindade cria todas as coisas do universo?

Mas então reencarnamos, e surgem "as formigas, os besouros, as vespas, as abelhas - e o contato direto com a aspereza e a sujeira inerentes à terra"... - na forma dos desafios, dos dissabores, das indelicadezas próprias da natureza falha do ser humano em curso evolutivo. A falta daquela "leveza" passível de emprestar facilidade a todos os desafios a serem enfrentados, quando analisados "de lá", daquelas esferas maravilhosas da vida, cheias de luzes, na companhia dos amados e dos mentores seguros e gentis que nos estimulam no prosseguimento do caminho...

É preciso prudência nas expressões dos nossos sentimentos. O todo da Criação sempre provocará admiração e êxtase no imo de nossas almas e de nossos corações; mas nunca deve ser ignorada a magnitude da "mão de obra" empregada na materialização deste colosso supremo. Nosso destino glorioso é o trabalho consciente e conjunto no enriquecimento eterno e contínuo desta Obra Criativa, mas, a exemplo do que bem já nos asseveraram Espíritos lúcidos como o de André Luiz, cada um destes prédios de altura vertiginosa que nos impressionam o sentido da visão na modernidade foi edificado "tijolo a tijolo", sob o custo do suor de muitos; a árvore frondosa e florida, de início, é o sonho incrustado na semente imersa nas profundezas escuras do solo, destinada a conquistar seu espaço sob o sol e os ares em impulso contínuo, centímetro a centímetro, em meio à aspereza da terra, em direção à luz vital que, irresistivelmente, a magnetiza...

Como tal, o melhor sonho do Criador ao nosso respeito, e em relação a tudo o que existe, é justamente isto: esta "visão de cima" ímpar, magnética, sem paralelo, para cada ítem da existência. E Ele ainda e sempre prossegue, sem se deter, mantendo, acima da miríade intrincada de detalhes necessários à sua execução, sem esmorecimento, a melhor visão para a realização final de cada coisa do Universo.

Que também nós, como co-criadores conscientes da importância da nossa missão individual na criação da nossa parcela de mundo, também mantenhamos o fascínio inicial do "projeto" pronto, perfeito, lindo, diante das nossas vistas. A nossa irresistível e entusiasta visão de cima. Que coloquemos mãos a obra, perseverando no ânimo inicial - conscientes dos detalhes e desafios a serem resolvidos e superados: "abelhas, terra áspera, pedras a serem removidas, um ou outro arranhão mais sério"; na certeza, contudo, de que a Arte Final será tanto melhor executada e satisfatória quanto mantenhamos a convicção de que não constituem eles, os desafios, o objetivo, mas sim o inevitável trajeto. A "massa de manobra" necessária ao nosso aprendizado, tanto para criar e materializar edifícios magníficos e estradas tortuosas no cenário terrestre, quanto os mundos de luzes e de panoramas fantásticos, no seio do infinito que nos aguarda...

Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 05/02/2006
Alterado em 05/02/2006
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